Contos Embaralhados

terça-feira, 13 de setembro de 2011

♠ O Odiado - Bonito Pesadelo (Capítulo 1)



Pietro Marques era um jovem de dezessete anos que morava e estudava no internato Santo Estevão. Era o seu último ano e não via a hora de sair, pois odiava aquelas pessoas.
Apesar de ser muito inteligente e ter ganhado vários prêmios pela instituição, além de ser um ótimo nadador, sofria com brincadeiras de mau gosto por ser novato. Tinha entrado no ano passado e ainda não firmara suas amizades. Pelo contrário. A maioria da sala não gostava dele, principalmente Edgar, um jovem branco de cabelo preto e olhos claros, bem parecido com Pietro, a não ser pela cor do cabelo – Pietro era ruivo. Edgar também era um ótimo nadador e líder da sala.
E todo esse ódio pelo novato começou desde que à instituição. Vinha de uma família conturbada: o pai, chefe de uma organização criminosa e mãe, tinha problemas de esquizofrenia. Foi tirado de sua família por decisão judicial. Era de se esperar que Pietro também fosse um garoto abalado psicologicamente.  Porém ele era exatamente o contrário – pelo menos aparentava.
— Não podemos permitir esse garoto aqui! – falou a madre Evarista, uma senhora durona, que dirigia o colégio – Olha a ficha dos pais!
— Não podemos é julgar o menino pelos pais. – contestou o reverendo Azevedo, um homem de quarenta anos e com expressão jovial – Ele é anjo de tão bom.
Eles estavam numa mesa redonda discutindo sobre a entrada do novo aluno, um ano atrás, quando chega o Sr Carvalho, professor mestre em química do internato – um negro de trinta e seis anos e que comandava o Departamento de Ciências. Segurava uma folha de papel, que jogou na mesa.
— Olhem isso! – apontou para o boletim – Marques é um gênio da química.
— Ponto positivo pra mim.
— Pare de rir, reverendo Azevedo – interrompeu a madre, zangada – Esse menino é um demônio!
— Qual é madre superiora? Acha que vamos admitir um psicopata esquizofrênico? – zombou Carvalho – Ele é um bom garoto.
Madre Evarista, diante da maioria, teve que ceder.
— Vamos admiti-lo. Mas depois não digam que eu não avisei.

Já neste ano a situação havia melhorado (um pouco). Felizmente já havia uma minoria que o defendia. Um deles era Benjamim Alencar, um rapaz que tinha pele clara e cabelo loiro encaracolado, e era o seu melhor amigo. Um colega de quarto que se transformara num grande amigo. Também havia Vanessa Oliveira, a garota por quem Pietro era apaixonado. Tinha um belo corpo e uma pele alva, que contrastava com seu cabelo negro e ondulado. Apesar de andar com os “garotos maus”, não gostava das brincadeiras que eles faziam com Pietro.
O internato era grande – ocupava um quarteirão inteiro na Grande São Paulo e possuía tudo que um aluno precisa. O laboratório, por exemplo, tinha todos os elementos químicos necessários para uma grande catástrofe, por isso pouquíssimos alunos tinham acesso.
À noite, nesse mesmo laboratório, entrava um casal de estudantes. Pietro e Vanessa.
— Não acha que alguém pode nos pegar aqui? – perguntou Vanessa, enquanto Pietro a empurrava laboratório adentro.
— Eu tranquei a porta – respondeu, beijando-a fortemente – Além do mais EU te peguei primeiro.
O casal continuava com as carícias no laboratório escuro. Era noite e todos estavam dormindo. Ele a suspendeu e a colocou em cima da mesa, derrubando toda a vidraçaria no chão e quebrando tudo.
— Cuidado, garoto! – falou Vanessa, rindo.
— Você não vai querer que eu pare – sussurrou Pietro, ofegante, enquanto folgava o seu cinto – Ainda mais agora.
Pietro começou a abaixar as calças, mas foi interrompido por uma batida na porta.
— Droga! – gritou, recompondo-se – Sempre tem um estraga prazeres.
— Vai ver quem é garoto furacão. – disse a garota, com um sorriso malicioso.
Ele foi andando em direção à porta. Ficou com receio de abrir, pois podia ser o inspetor Santos. Mas era Edgar.
— O que você faz aqui? – perguntou Pietro, com raiva – Estou fazendo umas pesquisas.
Edgar entrou e deparou-se com os equipamentos destruídos. Parecia que tinha passado um furacão, mas sua raiva veio quando viu Vanessa em cima da mesa, meio sem graça e sem o que dizer.
— Edgar, eu posso explicar.
Este era outro fator que impedia o romance de Pietro e Vanessa: ela era namorada de Edgar. A fúria tomou o seu corpo, fazendo com que partisse pra cima dela.
— Vagabunda! – gritou o traído, com as mãos no pescoço dela – Como pode me trair com esse idiota!
Pietro não conseguiu segurar uma risadinha cínica. Mas não podia assistir aquilo. Aliás, ele também tinha culpa.
— Solte-a, infeliz – alterou-se, dando um soco na cara do agressor.
Os dois começaram a brigar, ficando cada vez mais violentos. Vanessa ficou desesperada, com medo deles se matarem. E esse medo agravou-se quando Pietro empurrou seu inimigo contra uma parede de vidro – com exceção das academias de ginástica, só o laboratório possuía paredes de vidro. Edgar caiu no chão do corredor, com cacos de vidro perfurando todo o seu corpo.
— Pietro! O que você fez? – Vanessa estava assustada.
— Esse cara ia te matar. – falou Pietro, com a respiração acelerada e um olho roxo.
Ele não conseguiu parar, o ódio consumira cada centímetro cúbico de seu corpo. Ao ver seu inimigo caído, sangrando, pegou um recipiente contendo soda cáustica.
— Ele já está morrendo! – gritou a garota, tentando impedi-lo, mas foi jogada no chão de tal força que desmaiou.
Pietro pegou a soda cáustica e fez com que Edgar a digerisse, colocando-a na sua boca.
— Agora você já era! – riu ao ver seu oponente morto. Pietro parecia outra pessoa, e talvez fosse.
No momento em que terminou, ele pensou em sair do laboratório, quando as luzes se acenderam. Todos do internato apareceram diante daquela cena de horror.
— Seu filho do demônio, maldito seja! – gritava a multidão.
O jovem não tinha como esconder-se. Em outra parte ele olhou para os lados. Havia fogo ao seu redor, como se estivesse no inferno.
— Vamos crucificá-lo – Pietro apareceu na cruz – Idiota! Idiota!

— Idiota! Acorda logo! – falou Benjamim. Ele estava rindo, vendo o seu amigo rolando na cama ao lado da sua. O quarto deles era o 221, com duas camas, tevê, banheiro e  notebooks.
— Desculpem-me! – gritou Pietro, acordando subitamente, ofegante e todo suado – Ufa! – aliviou-se, percebendo que não era verdade.
— Pelo jeito a noite foi boa. – riu Benjamim – Doces sonhos ou um bonito pesadelo?
Surpreso com a pergunta sem noção do amigo, ele respondeu do mesmo jeito:
— Com certeza um bonito pesadelo.
— Então o realize! – aconselhou o amigo, ainda sorrindo.
— Deus seja louvado! – rogou Pietro,  levantando-se da cama. Olhou para os lados, pensativo – Perdoe-me, mas não será tão ruim realizá-lo.
E saiu em direção ao banheiro. Já no banheiro ele lavou o rosto, tentando livrar-se do seu bonito pesadelo. Assustou-se com de Benjamim.
— Adianta que hoje é aula no laboratório!
Pietro olhou para o espelho com um sorriso de canto de boca.
— Que bom, Bem! Que bom. 

Uma obra de: Oliver Escobar

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